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Black Founders Fund: Como tornar o ambiente organizacional cada vez mais inclusivo e diverso?

Retrato de Flávia Garcia sobre fundo laranja, com padronagens triangulares.

A pauta de diversidade e inclusão tem se tornado cada vez mais importante no meio corporativo, e grande parte das maiores empresas do Brasil vem buscando implementá-la em sua cultura organizacional. Essa mudança ajuda a transformar o cotidiano da empresa em um cenário o mais diverso possível, mas, por se tratar de um tema complexo e delicado, não é tão simples e fluida quanto aparenta ser.

Existe uma infinidade de boas práticas que podem ajudar uma companhia a dar os primeiros passos rumo à representatividade e, para entender melhor sobre o tema, conversamos com a Flávia Garcia, Head de Diversidade e Inclusão no Google para a América Latina. Ela também é membro do AfroGooglers, um comitê voltado a trazer visibilidade e representatividade para a comunidade negra dentro da empresa. Confira abaixo a entrevista completa.

Qual a importância, para empresas, de se ter diretrizes de inclusão e diversidade?

Existem muitas pesquisas e estudos que correlacionam ambientes mais diversos com maior probabilidade de retornos financeiros. A pesquisa mais tradicional do mercado, feita pela McKinsey há 10 anos, conseguiu provar isso com relação a questão de gênero. Mas, nos últimos cinco anos, esse mesmo estudo trouxe a questão da raça para comprovar essa relação da diversidade versus retorno financeiro.

Algumas outras pesquisas também relacionam diversidade à inovação, motivação e sentimento de felicidade dentro de uma organização e corroboram, com dados, que um ambiente mais diverso traz os mais variados retornos para uma empresa.

Trabalhar num ambiente diverso agrega, porque proporciona a liberdade que indivíduos precisam para serem eles mesmos.

Como fazer com que as minorias se sintam acolhidas dentro do ambiente corporativo?

É importante tentar entender quais são os padrões do ambiente organizacional. Por exemplo, em uma reunião, prestar atenção em quem está falando e quem está sendo interrompido, quais ideias estão sendo valorizadas, quantas pessoas negras estão ali.

O atual contexto é de uma cultura corporativa que valoriza muito mais o estilo de liderança solitário e menos colaborativo. Por isso, mapear esses padrões é essencial para gerar reflexões honestas acerca do que está acontecendo na empresa. O ideal é não apontar culpados, mas criar um espelho, pensar nos responsáveis por essa mudança e quais mecanismos podem ser implementados para que ela aconteça. O acolhimento vem com a interrupção desses padrões e isso deve partir da liderança, que é o agente transformador primário do contexto organizacional.

Qual seria o primeiro passo para uma startup incorporar diversidade e inclusão no negócio?

O primeiro passo é entender por que a diversidade é importante para aquele negócio, e que a resposta de cada empresa é diferente. Pode ser porque os usuários dos produtos oferecidos representam um público diverso e, por isso, a empresa quer refletir isso no corpo de trabalho. Pode ser, também, porque ela quer atingir um novo público, ou porque a diversidade está relacionada a questões pessoais dos próprios fundadores. Então, é fundamental entender por que, em cada situação, a diversidade faz sentido para o negócio.

No Google, por exemplo, que tem como missão servir a todos, é essencial que a força de trabalho reflita esse ideal e seja inclusiva.

O nosso serviço está disponível para todo mundo, então nada mais coerente do que ter o máximo de representatividade possível no ambiente corporativo.

O segundo passo é conscientizar a liderança de que as mudanças devem sempre partir dela. Com isso, é possível chegar nas medidas que serão tomadas para que o processo de transformação ocorra. Quais treinamentos serão necessários, como a equipe vai se informar e aprender sobre o assunto, já que a diversidade não é um conceito estrutural, demanda um esforço ativo para ser aprendido.

O terceiro e último passo está bastante relacionado à área de Recursos Humanos, porque abrange os mecanismos, processos e decisões que devem ser tomadas para gerar essas mudanças. Eu percebo que, mesmo nos ambientes mais inovadores – como as startups – as decisões tomadas mantêm o status quo e isso não traz resultados diferentes. Para que isso aconteça, é preciso desafiar esse status e entender que esse processo não é linear. Vão ter erros e acertos, mas com persistência as mudanças se tornam cada vez mais visíveis.

Quais são as principais barreiras que impedem organizações de pensar de maneira mais inclusiva?

Acredito que seja o status quo. Um ambiente heterogêneo é mais criativo, disruptivo e satisfatório em diversos âmbitos, mas não é confortável. Trabalhar com pessoas diferentes implica em um desconforto que, muitas vezes, não combina com o ambiente corporativo. Percebo que muitas empresas que estão nessa jornada de inclusão acabam interrompendo esse processo quando chegam nesse cenário desconfortável. Mas esse incômodo já é algo esperado e, por isso, é tão importante que a liderança queira desafiar o esse estado no qual as coisas se encontram e faça o necessário para isso.

Qual conselho você daria para uma startup do que não fazer em termos de diversidade e inclusão?

Não faça essas mudanças sem antes ter uma reflexão clara do porquê. Fazer porque está na moda ou porque vai trazer uma boa reputação e imagem para a empresa gera um discurso inconsistente e não vai dar certo.

É imprescindível ter muito claro o motivo pelo qual a diversidade e a inclusão são importantes pro negócio.

Checklist rápido da Flávia para as startups que buscam um ambiente mais inclusivo e diverso:

  1. Garanta o entendimento de todo mundo do que significa diversidade: Isso pode ser feito por meio de treinamentos, principalmente para liderança, que normalmente não é composta por sub-representados, mas que precisa ser uma aliada nesse processo.

  2. Tenha todos os papéis bem claros: Aqui no Google, por exemplo, temos a área de Recursos Humanos, onde eu trabalho, para questionar as práticas atuais; a liderança, para atuar como agente transformador; e um grupo de pessoas sub-representadas, para ajudar os outros dois papéis a entender o que está dando certo e o que não está.

  3. Questione os processos e sistemas: Entenda como todas as decisões da empresa podem ser tomadas com uma lente de diversidade, para que o processo de mudança seja sustentável. Esse é um assunto que precisa estar sempre em pauta. Se ele cair, a empresa falha na missão.

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